Eu vejo os expoentes da minha nação sendo
destruídos pelo vírus da "sertanejite". Vejo-os deitados,
levados pelas melodias de acordes básicos, tão simples, tão fácil... Tão
comercial! As madrugadas sem os trompetes celestiais com o dínamo
estrelado da maquinaria da noite, saem de cena para a falsa identidade
sertaneja: botas nunca sujas de barro, mãos (des)calejadas viajam
sentadas em representações imaginarias do tão escuro baile de máscara dos
miseráveis jovens que não sabem o que são, da onde vêem e muito menos:
pra onde vão? Não há água ardente, flutuando pelas gargantas. Não há
identidade. Guimarães... Cunha... Por que tentaram retratar o sertão? Se o
que sobra do sertão não é mais contado em histórias populares. Tudo é como
Canudos do século XXI: submerso. Cérebros ao céu e anjos
maometanos viram espasmos de diabos cambaleados por ruídos contínuos de
bares, boates... Chapéus radiam o Interior que ninguém conhece,
que não existe. Peões são expulsos das factualidades por serem poucos
reais, menos humanos. São produzidos e
consumidos. Cidadães repetem odes obscenas nas janelas do
crânio, que se refugiam em baladinhas de pintura descascada em roupa de
baixo queimando seu dinheiro em cestas de papel, escutando o Terror através
da parede. Eles choram diante do
romance das ruas com os seus carrinhos de mão cheios de cebola e
péssima música.
Desumanizados sentam nos degraus de
granito do manicômio com cabeças tampadas de chapeis à peão e fala de arlequim
sobre os "ão", exigindo lobotomia imediata. Não há, nunca haverá
o novo! O vazio concreto da insulina metrasol do toque eléctrico da
viola gera amnésia, que num protesto sem humor viraram apenas uma
mesa simbólica da amargura, mergulhando logo a seguir a catatonia, voltando
anos depois, realmente calvos com uma peruca de esporas, lágrimas e dedos para
a visível condenação de (pseudo) neofílicos nas celas das cidades.
Todos ficam agitando, rolando e balançando no banco da solidão à meia-noite dos
domínios de mausoléu druídico do amor, o sonho da vida vira um pesadelo,
corpos transformados em pedras tão pesadas quanto a lua e o último livro
fantástico é atirado pela janela do cortiço.
A última porta é fechada às 4 da
madrugada. O último telefone é arremessado contra a parede em resposta
e o último quarto mobilado esvaziado até à última peça de mobília mental, uma
rosa de papel amarelo retorcida num cabide de arame do armário e até mesmo isso
é imaginário, nada mais que um bocadinho esperançoso de alucinação — ah,
nação, enquanto tu não estiveres a salvo eu não estarei a salvo e agora tu
estás inteiramente mergulhada no caldo animal total do desprezo — e que
por isso correram pelas ruas geladas obcecados por um súbito clarão da alquimia
do uso da elipse do catálogo de rimas simplórias que sonharam e
abriram brechas encantadas no popular através de imagens justapostas que capturaram
o arranjo da inutilidade do léxico e reuniram os verbos descartáveis e juntaram
o substantivo e o choque de consciência saltando numa sensação de "Pater
Omnipotens Aeterni Deus", para copiar a sintaxe e a medida da pobre
prosa humana e ficar estagnados, mudos e trémulos de vergonha, rejeitados todavia,
expondo a alma ignóbil, conformando-se ao ritmo do pensamento da sua
cabeça nua e limitada, conhecido mas mesmo assim deixado aqui o que houver
para ser dito ao povo após o gozo. São todos reencarnados na roupagem fantasmagórica
do novo espectro de violão dourado da banda musical que fazem soar o sofrimento
da mente nua do Brasil pelo amor num grito de "ai ai" que fez com que
as cidades tremessem até ao seu último rádio, com o coração absoluto do
(des)uivo da vida arrancado para fora dos seus corpos bons para consumir por mais
quinhentos anos o ruim.
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