Nascemos livres. Entretanto, a
sociedade e nós mesmos criamos enumeradas cadeias e limitações para nós. Mas,
dentro de nós, dependendo de nossa própria vontade, podemos ser “livres”, mesmo
que aprisionados por grilhões sociais ou imaginários.
Se a palavra "liberdade"
é uma ânsia tão profunda de nosso léxico e ser, ela não significa como tantos
pensam, fazer qualquer coisa, como, quando e onde quiser. Isto tem um nome:
licenciosidade (ou libertinagem!).
A liberdade liga-se ao poder de
decisão, de escolha. Este é o bem que não conseguimos admitir que alguém nos
tire.
Todos temos um projeto fundamental
de vida e queremos ser livres para realizá-lo. É nesta execução que exercitamos
a liberdade porque o caminho sempre terá percalços, encruzilhadas etc. que nos
obrigará a renúncias, em outras palavras, nos dará um número incontável de
oportunidades de "decidir" o que fazer para perseguirmos nossos
ideais.
Parece contraditório, mas muitos de
nos tememos a liberdade. Não sabemos o que fazer com ela. Preferimos, muitas
vezes, sermos escravos. Isto pelo fato do outro lado da moeda nos exigir a tão
temerosa palavra: "responsabilidade". A Liberdade é um espaço de vida
e ao mesmo tempo um espaço em branco, onde devemos agir, querer, pensar, realizar.
E isto assusta!
Devemos lembrar que o sentido mais
profundo da questão da liberdade é que, se ela não existisse, o homem se
misturaria com a natureza, não se diferenciando das demais coisas, pois estaria
inteiramente submisso ao determinismo. Ser-sujeito é ser-livre: somente com
base nesta idéia é que se pode entender a liberdade da ação humana.
O homem pertence a si mesmo, é um
“eu”, uma pessoa; por conseguinte, só pode ser compreendido como autônomo, com
certa independência de ser.
É lógico que não existe e nem pode
existir uma liberdade absoluta, porque o sujeito não é uma subjetividade
isolada: o “eu” se põe em relação, existe, é intencional, é situado. Como
auto-afirmação, o “eu” é a possibilidade do ser.
Sartre exprime a prioridade da ação
humana e, portanto, sua liberdade pela caracterização do existencialismo: “A
existência precede a essência”. O filósofo não deixa de ter razão, pois o homem
não é uma coisa e, portanto, há uma prioridade de sua subjetividade, que
implica, logicamente, na liberdade e no livre-arbítrio.
Para Sartre o mundo real da
liberdade se distingue do mundo sonhado. Principalmente, porque toda fixação
livre de fins realiza-se numa situação particular e toda escolha se faz em
função de certo passado. O sujeito, como liberdade, só ocorreria, pois, envolto
em uma determinada “facticidade”, que representa as limitações para o projeto
de vida.
Ser livre, nem sempre significa
“alcançar” o ideal, mas auto-determinar para querer e escolher. Daí se conclui
que Sartre concebe o sujeito como intencionalidade, assim como livre os seus
projetos, execuções e ações.
Toda escolha é uma “decisão” (sic!!!)
sobre opções diversas dentro de certas circunstâncias. A ação livre do homem,
significa que ele sabe o que faz, supõe que esta ação precede de uma decisão.
Agir humanamente implica agir com
liberdade, assim ela vai nos aparecer, também, como dever, algo que, de
qualquer forma, deve ser conquistado para que sejamos plenamente humanos.
Para relembrarmos, então, da forma
que já colocamos anteriormente, o “eu” é liberdade, rompendo com o
determinismo, enquanto nada “determina” a sua ação como “humana”.
Aliás, o homem só pode realizar a
sua humanidade quando luta para se desfazer do peso de qualquer “facticidade”
que o escravize. A história da conquista da liberdade é eterna porque sempre
uma forma de libertação faz surgir novas formas de escravidão.
Para Marx o trabalho é o que faz o
homem ser homem. Isto acontece de fato, exatamente porque é no trabalho que o
homem torna sua atividade objeto de sua consciência e vontade.
Contudo, a tecnocracia,
característica de nossos dias, é uma série ameaça à liberdade. A técnica é um
bem “em si” para o homem, mas a tecnocracia o escraviza. Ao escrevermos sobre
ela, Heidegger nos alertou sobre o “esquecimento do ser”. A mentalidade
tecnocrática cria novas formas de escravidão. E, como vivemos em uma sociedade
tecnocrática, este é um tema que merece bastante reflexão (mesmo às 6 a .m). Até onde a técnica está
ao nosso favor? Se os meios de produção da própria técnica estão nas mãos de
poucos, até onde seremos realmente livres? Mudar, entretanto, o poder de mãos
não significa, necessariamente, liberdade, como pensava Marx, porque as novas
mãos podem ser de indivíduos também sequiosos por poder, sem sentimento de fraternidade.
A liberdade, portanto, em nosso ponto de vista, só pode ser exercida pelo
afeto.
Gostaríamos de concluir essa
divagação (agora matutina) com um “grito” de Tarkovski que iniciou tudo isso:
“Ai de nós, a tragédia é que não sabemos ser livres - pedimos para nos mesmos,
em detrimento dos outros, e não queremos renunciar a nada de nós em prol do
outro: isso significa usurpar nossos direitos e liberdade pessoais. Hoje, todos
nós estamos contaminados por um egoísmo extraordinário e isso não é liberdade: liberdade
significa aprender a exigir apenas de si mesmo, não da vida dos outros, e saber
como doar: significa sacrifício em nome do amor.”
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